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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Gabriel Perissé: “A escola não ensina a ler para questionar"

Para o autor de 'Ler, Pensar e Escrever', doutor em Filosofia da Educação, não saber ler bem é a maior falha de quem não escreve bem

CAMILA GUIMARÃES - 15/02/2015 10h00

 

Gabriel Perissé: "Ler bem significa tirar sentido de um texto, gerar um raciocínio.
É um exercício também de imaginação". (Foto: Foto/ Divulgação)

ÉPOCA - Qual é a principal habilidade que falta nos jovens que não sabem escrever bem?
Gabriel Perissé - A leitura é uma prática que precede a escrita. Estou falando de uma leitura interpretativa, não apenas mecânica. Ler bem significa tirar sentido de um texto, gerar um raciocínio. É um exercício também de imaginação.

ÉPOCA -
Como ensinar esse tipo de leitura?
Perissé - Ela envolve três fatores: a qualidade dos textos que circulam, o acesso a eles e mediação necessária entre o leitor e o texto, que é feita pelo professor e pelos pais. Sobre esse último ponto, temos um problema e tanto. Para começar, os professores não leem. Consequentemente, também não escrevem. Temo falhas sérias na formação dos que têm a função de ensinar a ler. A escola não ensina a ler para questionar, ensina a ler para acatar. Daí surgem os leitores com dificuldade para entender ironias, as entrelinhas. E não adianta nada aulas com macetes, técnicas, dicas e truques. Isso não resolve o problema.

>> Use a internet para escrever melhor

ÉPOCA - Qual é a origem dessa má formação dos professores e da baixa qualidade das escolas?
Perrissé- Há um contexto histórico. Até as décadas de 60 e meados da década de 70, tínhamos uma leitura sofisticada. Até na imprensa. Pense em textos de Nelson Rodrigues, por exemplo. Ou do Otto Lara Resende. Depois os textos de jornais e revistas entraram num período mais técnico, neutro e objetivo. A ditadura militar, por sua vez, apagou qualquer estímulo ao pensamento crítico, ao mesmo tempo em que a escola passou a ser acessível para muito mais gente. A partir dos anos 80, colhemos o resultado disso. Surgiu uma geração que não sabe criticar, ponderar, a pensar por conta própria, que busca nos textos não a contundência de antes, mas apenas a informação. A formação ruim dos professores é fruto desse cenário. O próprio curso de Letras ficou desprestigiado.

ÉPOCA - Há alguma melhora nesse cenário?
Perissé - Há muitas tentativas. Talvez daqui a 15 anos melhore, se tudo der certo, mas acho que ainda sofremos hoje as consequências desse passado. Tem aí uma molecada de 11, 12 anos, filhos de uma geração mais antenada, que leu Harry Potter – obra contemporânea e de qualidade – que se liga mais em leitura, que descobriu que ler pode ser bacana graças a essa obra. Para os pais, um aviso: envolva seu filho na leitura. Quando nos cercamos de pessoas com certas habilidades, fica muito mais fácil aprender e gostar. Não dá tempo de ler junto todo dia? Leva para passear na livraria.



Fonte: Revista Época - www.epoca.com.br


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